28/08/2008

Hölderlin

"O arauto dos imperativos do Além"
Nietzche

Friedrich Hölderlin (1770 – 1843), segundo L. Ryan, pertence a estes poetas "a quem em vida é recusado a glória e o reconhecimento. Mas, como de hábito uma nova época gloriosamente ressuscita".1

O poema que trazuzimos, "Menons Klagen um Diotima", foi escrito nos anos em que o poeta viveu em Homburg (1798/1800) provavelmente em 1799, e publicado originalmente com o título de "Elegie"; em 1800, Holderlin retomou-o mudando-lhe o título e dando-lhe a versão que conhecemos; tendo sido, então, publicado em 1803, no "Almanaque das Musas" de Vermehren.2

Baseamo-nos para a tradução na edição das Obras Completas de Hölderlin (Grosse Stuttgarter Ausgabe) organizada e comentada por Friedrich Beissner e Adolf Beckt.

A busca do sagrado é o cerne, a essência da poesia de Hölderlin; e como afirmou Heidegger: "A estrutura da poesia de Holderlin é essa determinação poética que exprime a essência da poesia em si mesma. Holderlin é para nós, num sentido privilegiado, o poeta do poeta".3

É nesse sentido que é preciso compreender a poesia e a vida de Hölderlin, esse alemão de alma grega que com suas traduções de Sófocles e Píndaro, incorporou-os ao idioma alemão. Poeta, talvez o único em sua época a realizar a síntese dionisíaco-apolínea do espírito romântico e da forma clássica. É não só um dos grandes poetas da língua alemã, mas um dos maiores da literatura universal. Atestam estes adjetivos, poemas como: "Patmos", "Der Archipelagus", "Der Wanderer", "Brot und Wein", "Der Einzige", "Menons Klagen um Diotima", "wie wenn am feiertag", etc; e um dos mais ternos livros que a alma de um poeta já teceu: "Hyperion ou o Eremita da Grécia".

Em 1799, aos 29 anos, escrevia ele à, sua Diotima (Susette Gontard): "Todos os dias tenho que reinvocar a divindade desaparecida. Quando penso nos grandes homens das gráfides épocas1, que em torno de si espalhavam o fogo sagrado, transformando em chama tudo o quê era morto, seco e a palha do mundo, que com eles subia ao céu; então, penso em mim; uma frágil cadeia, vagando, mendigando uma gota de óleo para iluminar um pouco a noite; assalta-me um estranho tremor e digo a mim mesmo estas palavras terríveis: morto vivo!

Sabes porque é assim? Os homens têm medo uns dos outros. Temem que o gênio de u devore o de outro, eis porque concedem espontaneamente apenas o alimento e a bebida, mas nada que possa saciar a alma..." Holderlin não fez de sua obra apenas a essência da poesia; ele viveu essa essência, levando às últimas conseqüências o seu universo poético e cortando durante 40 anos qualquer relacionamento com o mundo exterior. Holderlin não enlouqueceu, é a realidade em si mesma, que é absurda; enfrentando o seu próprio demônio, cumpriu apenas "a Vocação do Poeta". Quantos poetas de hoje e de sempre não travaram esse combate, fazendo do ato poético a sua própria vida? – Villon, Blake, Novalís, Poe, Nerval, Schumann, Van Gogh, Rimbaud, Strindberg, Artaud, etc. E o mundo real, o que pode oferecer aos poetas? Mundo do qual, disse muito bem Dylan Thomas: "Metade éconvenção, metade é mentira".

Carlos Lima

Poeta e professor da UERJ

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Johann Christian Friedrich Hölderlin

Lamentos de Menon por Diotima

I

Dia após dia, eu vou buscando sempre um novo rumo,
Interroguei há muito da terra todos os caminhos,
Tenho visitado a frescura dos mentes, as sombras
E as fontes, por toda a parte erra meu espírito,
Mendigo de repouso, como um animal ferido para o bosque foge,
Onde outrora, ao meio dia, à sombra, seguro repousava,
Mas o seu verde abrigo já não lhe pode confortar o coração,
Gemendo e insone vaga, os espinhos o ferem.
Não o socorre o frio da noite, nem o calor do dia,
É inútil que nas águas do rio lave suas feridas.
E em vão, a oferenda que lhe faz de suas ervas
A terra, a febre de seu sangue nenhum zéfiro alivia,
Também a mim, ó amados! Ninguém
Poderá afastar de minha fronte o funesto sonho?

II

Sim, de nada serve, deuses da morte! Uma vez que
Manténs prisioneiro o homem vencido,
Depois, ó cruéis, de precipitá-lo na noite terrível,
Buscar, implorar ou insultar-vos,
Ou talvez paciente ficar neste doloroso exílio
E sorrindo ouvir esta canção prosaica.
Tem que ser assim, esquece tua salvação e adormece em silêncio!
E contudo sobe do meu peito a canção da esperança,
Ainda não podes, ó minha alma! Não podes ainda
Habituar-te e sonhas no meio do sono profundo!
Nenhuma festa, mas gostaria de coroar meus cabelos,
Então, eu não estou sozinho? Um sinal amigo deve chegara mim
No entanto longe, sorrio e surpreendo-me
De tão feliz estar em meio à dor.

III

Luz do amor! Õ luz dourada, brilhas também sobre os mortos?
Imagens de um tempo mais calmo, brilhas para mim na noite?
Amados jardins, montes do crepúsculo,
Sejam benvindos, e vós, silenciosos caminhos do bosque,
Testemunhas de celeste ventura, e vós, estrelas altíssimas.
Que outrora tantas vezes.me abençoastes!
Vós, também amadas, belas filhas dos dias de maio,
Serenas rosas, e vós, lírios, eu vos invoco ainda!
As primaveras passam, é certo, um ano vence outro,
Alternam-se e lutam, assim passa o tumulto do tempo
Sobre os mortais, mas não para os olhos felizes,
Aos amantes uma outra vida é concedida.
Pois, todos os dias e anos dos astros, eles estavam
Diotima! Junto de nós, íntimos e eternos;

IV

Mas nós, felizes de estarmos juntos, como cisnes apaixonados,
Quando no lago repousam ou balançam nas ondas,
Contemplando as nuvens de prata que se refletem na água,
E o azul etêreo que o seu curso agita
Assim caminhávamos sobre a Terra. E se o norte ameaçava,
O inimigo dos amantes, forjando lamentos e caíam
Dos ramos as folhas e voava no vento a chuva,
Sorríamos tranqüilos, sentíamos o próprio Deus
Em nossas confidencias, no cântico único da alma,
Sós, na nossa alegria infantil em plena paz.
Mas agora a casa é um deserto e tiraram-me
Os olhos e,sem eles, perdi-me.
Por isso vago; como as sombras terei que
Viver, e há muito, nada tem sentido para mim.

V

Celebrar eu queria, mas para que? E com outros cantar,
Pois sozinho, falta-me tudo o que ê divino.
Esta, eu sei, é a minha impotência e uma maldição entorpece meus
Nervos e abate-me, logo que começo
Inerte passo todo o dia, mudo como as crianças;
Apenas desce dos olhos uma lágrima fria,
E pertubam-me as flores do campo e o canto das aves,
Com sua alegria, pois são também arautos do céu,
Mas no coração frio, o sol que dá vida
Sinto-o fraco e estéril como os raios da noite,
Ah! Inútil e vazio como as paredes de uma prisão, o céu
Como um fardo opressivo paira sobre minha cabeça.

VI

O juventude, que outrora conheci tão diferente!
Não há oração que te traga de volta,
Nem caminho que te reaproxime?
Acontecerá a mim, o que outrora aos ímpios
Que com olhos ávidos tomaram lugar à mesa dos eleitos,
Mas logo saciados, os exaltados hóspedes
Calaram-se e com o canto dos ventos
Sob a terra florida adormeceram, até o dia
Em que um milagre do abismo os resgate
E retornem a caminhar sobre a terra verdejante.
-O sopro sagrado penetra a figura iluminada
Quando a festa se anima e o fluxo do amor se eleva
Emenbriagada com o céu, a torrente viva murmura
E ressoa no abismo, a noite devolve seu tesouro,
Sobe dos rios, o brilho do ouro oculto.

VII

Mas, ó tu, que outrora no meio do caminho
Quando diante de ti, abatido, consolaste-me com a beleza,
Tu que me ensinaste a ver a grandeza e com alegria cantar os deuses
Silenciosa, como eles, ensinaste-me o entusiasmo e a calma,
Ô filha dos deuses! Apareces e saúdas-me como outrora,
Falando-me, como outrora, das coisas sublimes?
Vês? Tenho que chorar e lamentar por ti, e quando
Penso em tempos mais nobres a alma se envergonha.
Pois, há tanto, tanto tempo pelos fatigados caminhos da terra,
Habituado a ti, eu te busquei errante,
Cordial espírito protetor! Mas em vão, os anos dospersaram-se
Desde que palpitava em nós o brilho da noite.

VIII

So a ti, a tua luz, na luz te guarda, Heroína!
E tua paciência te mantém amorosa, ó terna!
E nem sequer estás só, há muitos companheiros,
Onde floreces e repousas sob as rosas dos anos,
E o próprio Pai, no doce sopro das musas
Envia-te as meigas canções do sono.
Sim! Ela é ainda a mesma! Ainda surge, como outrora
Caminhando serena para mim, a Ateniense.
E mesmo, amigável espírito, que de tua fronte calma
Tombe sobre os mortais a benção do teu raio,
Revela-te a mim, fala-me, para que dizer aos outros possa
Porque, também, há outros que não crêm,
Que a alegria é mais imortal que a aflição e a cólera
E que ainda existe um dia de ouro no fim de cada dia.


IX

O celestiais! Assim vos dou graça e enfim
O sopro da prece alivia o peito do cantor.
E como no tempo em que ficava com ela no monte ensolarado,
Um deus fala do interior do templo, dando-me vida.
Já floresce o verde, quero viver também! Como uma lira sagrada
Clamam os montes prateados de Apolo!
Vem! Foi como um sonho! As asas que sangravam,
Já estão curadas e renascem todas as esperanças.
Há muitas, muitas grandezas ainda a descobrir, e quem
Tanto amou, tem que ir pelo caminho dos deuses.
E acompanhai-me, horas solenes! Taciturnas horas
Da juventude! Perdurai santos presságios,
Piedosas preces, entusiasmos, e vós
Bons gênios que acompanham os amantes,
Ficai conosco até que no lugar para onde
Retornam os bem-aventurados,
Lá, onde estão as águias, os astros e os mensageiros do Pai,
Lá, onde estão as'-tn"usas, onde vivem os heróis e os amantes,
Lá, ou aqui mesmo, sobre uma ilha orvalhada nos reencontraremos,
Onde os nossos, enfim, em comunhão florescem
Onde os cantos são verdadeiros e perduram as primaveras mais belas
E da nossa alma começa um novo ano.

Nota: O artigo sobre Hölderlin, assim como o poema Lamentos de Menon por Diotima foram publicados originalmente na revista "Alguma Poesia", editada pelo poeta Carlos Lima, durante os anos 1970 / 80

Quando eu era menino...

Quando eu era menino,
Um deus freqüente me salvava
Da gritaria e do látego dos homens,
Em segurança eu brincava
Com as flores do bosque;
As brisas do céu
Vinham brincar comigo.
E assim como alegras
O coração das plantas,
Quando estendem os braços
Meigos para ti,
Meu coração alegraste
Também, Pai Hélio! e como Endimião
Eu era o favorito Teu, sagrada Lua!
Oh vós todos, fiéis
Deuses amistosos,
Se soubésseis o quanto
Minha alma vos amou!
Não vos chamava eu então
Pelo nome, nem vós a mim
Pelo meu, como os homens
Quando se conhecem.
Mas eu vos conhecia
Como jamais aos homens conheci.
Eu compreendia o silêncio do Éter;
As palavras dos homens, não.
Educou-me a harmonia
Do bosque murmurante
E aprendi a amar
Debaixo das flores.
Foi nos braços dos deuses que eu cresci.

Johann F. Hölderling (1770-1843), Poeta alemão

21/08/2008

quem é quem


cada qual todos um, sempre em frente transforma pedra em pão, suporte stand.arte, se assim me permitirem o engenho e a sorte, as nuvens passam, as montanhas sobem, bem sabes se sim é assim, que entao seja; ha inumeros vivos.